Era parte da rotina de Rodrigo chegar em casa após a escola e encontrar seu pai, Luís, sentado diante da televisão com o controle remoto na mão direita. Mas às vezes ele não estava em casa.
Às vezes a casa estava sem o ruído da televisão alta, e isto não era um bom sinal.
Nestes dias, Rodrigo ia para o quintal e se deitava no chão do quintal, para observar as nuvens. Chicão, o cachorro da raça pastor alemão, lambia-lhe a cara e depois deitava apoiado no peito do garoto.
Às vezes até dormia. E sua mãe, Leila, que trabalhava como cozinheira em casa de família, chegava em casa todos os dias as oito, e o acordava no quintal. Rodrigo alimentava Chicão, tomava banho e começava a estudar. Eis que começava, sempre na mesma ordem:
Ouvia as correntes que prendiam o portão mexerem; Chicão latindo, furioso; um barulho irritante do portão sacudindo; seu pai gritando seu nome, ou o nome de sua mãe, precedendo sempre uma palavra rude.
Rodrigo corria em direção à garagem, mas as vezes Leila já estava lá para abrir o cadeado para o marido, que a empurrava com força para que saísse do caminho. Estava bêbado.
Na última vez, ele agredira Leila com tanta violência, que ela deixara de ir para o trabalho por quase duas semanas. Inventara uma doença qualquer para a patroa. Rodrigo, por sua vez, ligou em segredo para Sílvia, a patroa de sua mãe, para lhe dizer a verdade.
Com um bolo de cenoura nas mãos, Sílvia viera visitar Leila, e ofereceu-lhe ajuda. Leila agradeceu, porém disse que não seria necessário, pois nada era o que parecia. Sentiu-se traída pelo filho.
Rodrigo fora repreendido por sua mãe.
Desta vez Rodrigo olhava para os modos do pai, para as súplicas da mãe, e pensava. Foi até seu quarto e fechou a porta. Leila o chamava. Era sempre assim...
Ela chamava o filho para apartar a briga. Ele vinha, separava. A mãe chorava, o pai saía outra vez, ou se trancava no quarto.
Rodrigo tinha 15 anos, e já estava cansado. Foi até a cozinha, onde o pai batia em sua mãe, mas não separou. Olhou a situação e, com um misto de indiferença e raiva, abriu a porta do quintal para que Chicão entrasse.
Como um raio, o animal entrou casa adentro e voou na perna de Luís, que caiu e tentou dar socos no cão, mas fora novamente mordido, desta vez no braço. Os dentes afundaram na carne do homem, que gritou. A mãe pegara uma vassoura para bater no animal, mas Rodrigo a deteve.
Colocou o cão no quintal. Seus pais, horrorizados, olhavam-no em silêncio.
- Se me dão licença, - disse o garoto – preciso estudar.
E voltou para seu quarto.
"A solução de Rodrigo", conto de minha autoria, foi originalmente publicado em Portugal no jornal Horizonte Vilacovense, em 26 de outubro de 2012. |