Em uma conversa, certa vez uma amiga perguntou a diferença entre “Mal” e “Mau”. Eis a resposta obtida:

“Mal é o antônimo de Bem e Mau é o antônimo de Bom”.

O bem e o mal são opostos, mas só o são por terem algo em comum. Ambos fazem parte de um mesmo Todo, que, sem qualquer um deles, perde o sentido, a força, e a significância.

O Yin e o yang são dois peixes, um claro e um escuro, que juntos formam um signo sem começo ou fim. Completo, complexo e perfeito. São opostos porque possuem algo em comum um com o outro. O olho do branco é preto e o olho do preto é branco. Se fosse diferente, não haveria equilíbrio. Ambos possuem ao outro dentro de si, e separados, não carregam qualquer significado.

Assim acontece com tudo o que é oposto, e tudo o que é oposto funciona da mesma forma.

Yin-yang não se trata por tanto de um símbolo de dualidade. Trata-se de um símbolo que representa o equilíbrio.

Veja a energia elétrica:

Você tem dois fios soltos, e precisa instalar uma tomada. Com um multímetro, você mede a energia e vê que, apesar de estarem separados, a energia percorre pelos fios. Mas se você tocar em um deles, qualquer que seja, nada vai lhe acontecer. Mas se você tocar nos dois ao mesmo tempo, você tomará um choque, você acenderá uma lâmpada, etc...

Chamamos esse fenômeno de corrente elétrica, e ela só faz essa mágica se você ligar os dois opostos, que recebem os nomes de negativo e positivo. Eu pergunto: qual a diferença entre os dois?

São necessários dois eletrodos (cada um com um polo) para se formar a corrente elétrica que gera a descarga de um desfibrilador no corpo humano. O corpo humano é um potente condutor elétrico e é somente através dele que o fluxo da descarga elétrica se torna possível.

Respondo: São opostos. Opostos de uma mesma coisa. Por tanto, não é que um é bom e o outro é ruim. São opostos, e se qualquer um dos dois estiver sem o outro, não funcionará. Yin e Yang.

É preciso de um adversário para rebater a bola de tênis, ou de uma parede ou chão para que ela quique. Senão não há jogo. Sempre é necessário que haja um oposto para tudo, e enquanto o oposto que houver para tudo o que fizermos for interpretado como algo ruim, algo mau, ou pior, “mal”, viveremos perdidos no meio de um eco, com cérebros vazios.

Somente com o oposto é há equilibro, que se fecha o círculo e dá ao peixe o formato de roda, capaz de mover-se em direção a algo.

É preciso estar mal para ficar bem. É preciso estar bem para ficar mal.

Uma metáfora interessante a esse respeito está no filme The Matrix: Reloaded. Quando Neo se depara diante do arquiteto, o arquiteto revela que a primeira versão da matrix fora programada para que a vida de todos os humanos fosse perfeita, e como ele próprio descrevera, uma obra de arte. Todos os humanos acabaram acordando em pouco tempo, e ele teve que reprogramar a matrix, para que a vida fosse caótica e conturbada, feito a vida que nós vivemos, e então funcionou.

Se a vida for fácil, não teremos que aprender a resolver os problemas. Por que na Grécia Antiga as pessoas não tinham celular? “Porque não existia” não é a resposta certa. A resposta certa é que na realidade, eles não precisavam. E todas a invenções surgiram sempre de alguma necessidade. 

Porque os romanos inventaram o parto cesariano? Porque precisavam. Tudo o que temos hoje são invenções de no máximo até o século dezenove. Tudo o que veio depois foi evolução disso.

Sem as adversidades, sem o “mal”, não buscaríamos um futuro melhor, e a palavra “utopia” não existiria. Jesus Cristo, Buda, Maomé, Moisés, nenhum deles existiria. Na verdade, nem nós mesmos, pois não precisaríamos existir.

Não haveria o senso de curiosidade ou esperança que costuma conduzir nossos atos.

Em Harry Potter e a Pedra Filosofal, Voldemort, quando seduz Harry para lhe entregar a famosa pedra, diz o seguinte: “Não há nenhum bem e mal, somente o poder, e aqueles tão fracos para alcança-lo”. Basicamente, Lord Voldemort estava coberto de razão.

Ainda que Dumbledore tivesse mais razão que ele quando enunciava seus discursos sobre o poder do amor, o que Voldemort dissera é que não existe o peixe branco e o preto, mas os dois juntos, e aquelas pessoas que são fracas demais para compreendê-los, e usar o poder que compreendê-lo dá.

Hitler fora um herói dentro de sua própria ideologia pavorosa. Ele acreditou em um caminho para salvar a humanidade, e foi até o fim dentro deste propósito, assim como Lord Voldemort. Como o algoz de Harry Potter, Hitler acreditava na pureza de sangue, e quis libertar o mundo das raças impuras, ou apenas subjugá-las. Eis a verdade: se ele chegou tão longe foi porque de algum modo terrível de se admitir, ele fez por merecer.

Quantos de nós acreditaram ter descoberto uma solução para qualquer um dos incontáveis problemas do mundo e não fizemos coisa alguma para viabilizar?

Os Hitlers não desistem! 

Esse é e o perigo que corremos por sermos tão conformados com os problemas do mundo. Só nos importamos quando o problema, que começou pra lá do mar, num continente distante, bate à nossa porta. Costumamos acordar quando já é tarde demais.

E é aí que entender o equilibro nos ajuda a aprender sobre o mundo um pouquinho mais. Aprender que o outro lado é importante senão nós, por mais "generosos e benevolentes" que possamos ser, podemos oprimir. Não obstante, não podemos tolerar que opiniões se tornem agressões baseando-se no direito de se dizer o que pensa. A história mostra que o desequilibrio "é mal" (mais mal que o Pica-pau) 😃😃.

Eu me lembrei agora de algumas frases de Og Mandigo em um dos livros mais piegas que já li (O Maior Vendedor do Mundo) na vida: “o fracasso pode estar em qualquer parte de meu caminho, mas a vitória pode estar depois da próxima curva. Só saberei se continuar”, ou “Porque não atirar minha lança em direção à lua e atingir meramente uma águia, ao invés de atirá-la na direção de uma águia e meramente atingir uma pedra?”.

O bem e o mal não existem. São duas forças opostas que se separadas, nenhuma funciona como se propõe a ser.

Alex Pedro

Quarta-feira, 02 de setembro de 2009

(Originalmente publicado em meu blog antigo)